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quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

O Zelador Invisível

O chão do saguão estava brilhando em sua grande parte, refletindo as pessoas, suas sacolas de compras, e todas as lojas, colunas e lixeiros do centro. Mas, de novo naquele dia, um garotinho resolvera melar seu chão com vômito.
Dom, o idoso zelador, caminhava em passos lentos com seus equipamentos de limpeza em direção ao estrago. O garoto chorava no colo da mãe, sentados em uma mesa próxima. Era um menino de cinco ou sete anos, com lisos cabelos negros e olhos azuis como o céu. A mãe era ruiva dos olhos azuis, e usava todo tipo de joia que alguém poderia imaginar. O vestido dela, longo, estava melado pelo sugo verde minimamente, mas a mãe estava cuidando do filho, sem se incomodar com o vestido sujo. Dom começou a lavar o piso com a habilidade que adquirira com os trinta e seis anos de profissão. Olhou para o chão do lado, brilhando, e viu que ele refletia a pequena biblioteca da senhora Jhoenne. Parou de limpar o piso, por um instante.
Jhoenne era a mulher mais linda que Dom já vira um dia. Mesmo com seus cinquenta e oito anos de idade e seus cabelos já grisalhos, ela o encantava, transformando-o em um adolescente no colegial novamente. Sempre que ela discutia com seus clientes sobre livros épicos, históricos e até mesmo alguns que descreviam arquitetura, seus olhos brilhavam de alegria. Ela amava o seu trabalho, assim como o velho Dom.
Sempre tentara reunir coragem para entrar na biblioteca e conversar com a senhora, ao menos um “olá” já iria fazê-lo feliz. Precisava sentir-se do outro lado da vitrine, ouvir sua voz, sentir seu perfume e tocar em sua pele. Mas nunca conseguira reunir coragem para tanto. Observava-a de longe, quando passava por aquele setor. Observava, com um certo ciúme, os outros idosos que visitavam a biblioteca, mas eles nunca faziam nada mais do que comprar livros grossos e poeirentos.
Terminou de lavar o piso rapidamente e se encostou em seu rodo de limpeza. Olhava todo dia para aquela biblioteca e sua dona. Sempre atento a qualquer ação importante que acontecesse, ou uma oportunidade para se apresentar. Não tinha ninguém na biblioteca no momento em que reuniu vontade para ir até lá, de cabeça baixa.
O carrinho de limpeza fazia o barulho de sempre enquanto ia, devagar, em direção à biblioteca pequena e velha de Jhoenne. Mas, dessa vez, fez um som alto o suficiente para chamar a atenção de Dom, uma das rodas estava solta. Ajeitou-a rapidamente e continuou sua caminhada, em direção ao amor de sua vida. Olhou novamente para a biblioteca. As sinetas da porta cantaram sua música quando outro homem, de mais ou menos a mesma idade de Dom, adentrou na biblioteca, ficou junto ao balcão e roubou um beijo da doce Jhoenne. Dom parou de repente, com o coração apertado e os olhos molhados, cheios de lágrimas. Lançou um olhar angustiado para Jhoenne, que olhou rapidamente para o zelador idoso. Dom desviou o olhar, abaixou a cabeça e foi para outro lugar, onde algum garoto de cinco ou sete anos estaria vomitando novamente...

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